segunda-feira, 17 de maio de 2010

A PORRA DO PSICANALISTA




Ele abriu a porta da sala, esperou que eu entrasse e me acomodasse. Na sala, dois sofás, um em L e outro de dois lugares. Sentei-me no cantinho do sofá em L de costas para a janela cheia de grades e acompanhada de minha sacolinha de primeiros socorros que continha um rolo novíssimo de papel higiênico, daqueles dos bons, branquinho e que não rala o nariz. ..Acho que a janela cheia de grades tinha como objetivo evitar uma eventual fuga de pacientes , pois esse tipo de situação desperta em qualquer um de início essa vontade quase que incontrolável Percebi que ele analisava todo e qualquer movimento que brotava do meu corpo.
Sentou-se então no sofá de dois lugares, no canto esquerdo (no meu ângulo de visão) e apoiou o braço esquerdo (dele) sobre o encosto do sofá do lado direito (também no meu ângulo de visão), como quem senta acompanhado e enlaça os ombros de seu (ua) companheiro (a).
Tive mesmo a impressão de que ele realmente estava acompanhado, principalmente quando começou sua fala.
Dizia: "Porque NÓS temos uma linha de trabalho que difere das outras. Todo trabalho apresenta diversas linhas, o NOSSO trabalho segue uma delas." (Lembrei-me imediatamente das aulas do curso de Pedagogia) ... Patati Patatá e uma infindável explicação sobre o funcionamento da Linha de trabalho DELES (????).
Uma sutileza e enrolação ao falar, que estava me deixando LOUCA! Por que as pessoas não são mais claras, objetivas? Por que não vão direto ao assunto? Por que para dizer que "comeram uma maçã" precisam dizer que "existe a natureza e que entre as diversas espécies vegetativas existentes na natureza existe uma árvore que se chama macieira, e que em um determinado momento inútil da vida dele ele plantou uma muda dessa maldita árvore, que levou anos para crescer e dar frutos. Esses frutos dessa maldita árvore tem como nome maçãs e ele sutilmente pegou uma escada de madeira construída com o tronco de uma árvore que existe na natureza (deve ter pegado mesmo, pelo perfil do cara) subiu nessa escada de árvore morta e colheu um desses frutos que se chama maçã e comeu".
Arrrrrrgh!!!!!
Seu discurso era tão sutil (deve ter trocado figurinhas com minha psiquiatra antes de conversar comigo) que me levava à um nível de irritação quase que insuportável.
"Porque NÓS vamos abrir a caixinha de Pandora, e lá, há coisas boas e ruins" (Pandora fudeu com tudo, resumindo).
"Mas quem vai decidir se vai encarar as coisinhas boas e ruins que saem da caixinha Pandora é a PAM (?????). NÓS (abraçado ao sofá. Comecei mesmo a pensar que ele não estava sozinho...) precisamos saber o que trouxe a PAM aqui, NÓS precisamos saber se a PAM está mesmo disposta a ir até o fim".
Ele definitivamente (como dizia Rain Main) não estava dirigindo as palavras à mim, devia estar falando diretamente com meus fantasmas. Acho que a mesma impressão que tive sobre ele abraçado ao sofá acompanhado por uma pessoa invisível ele teve sobre mim, sentada na pontinha do sofá L, acompanhada por vários fantasmas, meus fantasmas, aqueles com os quais por anos evitei conversar. Ao contrário de mim, ele provavelmente estava "visualizando" meus fantasmas, mas eu por mais que me esforçasse não conseguia "visualizar" a pessoa que o acompanhava.
"Existem três forças que nos regem, forças às quais devemos dar a devida atenção simultaneamente e equilibradamente, pois caso contrário essas forças entram em desequilíbrio e nos tornamos desequilibrados" (Ah.... Não diga!).
"Essas forças regem nossa vida e interferem diretamente no nosso bem estar, na nossa harmonia e consequentemente na harmonia das pessoas que nos rodeiam" (???????) E é difícil, muito difícil, mas não impossível, só depende da PAM (Arrrrgh! Estou aqui, porra!). "Todos são regidos por essas forças" (por que ele não fala logo quais são os raios das três forças e como fazer para mimá-las?).
Então eu digo: "E??????????"
"Então, se você der muita atenção à apenas uma delas, seja qual for, as outras ficarão desequilibradas, é como se fosse um triângulo".
"Então eu digo de novo: "E????????? Quais são?"
"Então, uma é a material (puta que o pariu, ele vai me falar para não comer mais batata frita, nem comer a caixinha inteira de BIS), a outra é a psico-emocional, e a outra é a energética, de energia mesmo. E..........................." Arrrrrgh! Cazuza tinha razão: "Eu vou pagar a conta do analista, pra nunca mais ter que saber quem eu sou".
"Pelo que você me diz, você é muito nervosa, por quê? Porque come a caixinha inteira de BIS (não falei que ele iria proibir a caixinha inteira de BIS ?), acumula muita energia, e não a queima fisicamente, descompensando sua regência energética, ou seja, descarregando de forma agressiva essa energia nas pessoas ao seu redor, provocando desarmonia.........."
Meu, sinceramente, eu não tô a fim de parar de comer batata frita, comer apenas três bombons BIS da caixinha, fazer ginástica e, se eu não dou conta nem de mim, que dirá de trÊs forças regentes, simultaneamente e equilibradamente? Cara, a vida é mais simples.
"Então, a PAM precisa saber que é tudo muito difícil, mas não impossível, só depende da PAM". Cara, se é tudo tão difícil, melhor se matar. Fiquei me imaginando em malabares, com três bolinhas, cada uma representando uma força regente e eu lá, olhando pras bolinhas e jogando elas para o alto sem deixar nenhuma cair.
E se eu pisar na merda? TODAS vão cair. Estão vendo? é um risco que se corre. Pisar na merda tentando equilibrar as bolinhas malabares das forças regentes.
"É importante que a PAM saiba que no momento não é recomendável que a PAM pare de tomar o fenobarbital, a risperidona e o Clobazam". Pensei: nem parar de comer batata frita e BIS.
"Sabe, a PAM precisa saber que a PAM necessita saber lidar com as questões ruins (ele se referia aos meus fantasmas). NÓS vamos abrir um leque de opções para que a PAM faça suas escolhas, mas a PAM deve saber fazer a escolha certa, precisa mudar". (Ninguém muda, eu sou eu, pronto acabou.)
"A PAM é muito teimosa e nervosa. Precisa mudar".
Nesse momento eu olhei bem pra cara dele e disse:
"O que você está querendo dizer é que eu sou infantil, tenho uma idade mental de doze anos, assim como a minha psiquiatra me falou?"
"Hummmmmmm.... É mais ou menos isso."
"Ah! tá bom. Isso eu já sabia."
Ele falava, e falava, e falava e a cada três palavras que falava dizia: "É tudo muito difícil..." E erguia o lábio superior direito (no meu ângulo de visão), o que me deixava meio enojada, pois dava pra ver parte da gengiva dele que com o movimento daquele tique nervoso produzia uma gosminha esbranquiçada e espumante. Tentava a todo momento justificar a eficácia da metodologia de trabalho DELES e convencer a PAM de que ELA realmente precisava ir até o final.
"Então, a PAM precisa saber que nada é fácil, é tudo difícil."
Aí, eu, de novo parei o discurso dele e perguntei:
"O que você está querendo me dizer é que eu sou covarde por ter adiado por 37 anos esse momento e que é preciso coragem para "visualizar?" e encarar os meus fantasmas?"
"Hummmmmmmm..... NÓS damos outro nome para "seus fantasmas". NÒS o chamamos de questões".
"Tá. Que seja. É isso?"
"Hummmmmmmmm.... É mais ou menos isso. Mas se vocÊ demorou 37 anos para chegar até aqui, provavelmente levará mais 37 anos para resolver totalmente suas questões"
. Não disse que era mais fácil se matar?
Ai, come logo essa maçã! Parece político falando. Enrola, enrola, enrola e não diz nada!
"Bem, pense sobre nossa conversa de hoje e tente desde já equilibrar suas forças regentes, para que possamos continuar nossa conversa na semana seguinte."
Ufa! Até que enfim. Cinquenta minutos infindáveis e torturantes.
Não é à toa que fui classificada como psicótica esquisofrênica delirante.
Despedi-me. Saí de lá e fui diretamente ao Fast Food mais próximo comer batata frita, um sanduíche sem alface e tomar um bom milk shake bem doce.

PAM

Nenhum comentário: