segunda-feira, 8 de agosto de 2011

SOBRE PAIS E FILHOS



Ter filhos ou não hoje é uma questão completamente controlável. Há recursos dos mais diversos para se evitar uma gravidez indesejada para os casais que pretendem programar o nascimentos dos filhos ou mesmo para os que decidem não os ter.
Há quem não se preocupe com a questão da prevenção, seja por desorganização ou mesmo por desleixo, ainda não entendo o porque, afinal nos dias de hoje informação é o que não falta assim como métodos contraceptivos oferecidos gratuitamente nos postos públicos de saúde, apesar da precariedade do atendimento especialmente nessa categoria, bem conhecidos por nós seja ela vivenciada na pele ou conhecida através dos meios de comunicação por quem não precisa se sujeitar as morosas filas de espera por atendimento, tendo condições de manter em dia o pagamento das altas mensalidades de planos de saúde que facilitam parcialmente o atendimento médico, mas não solucionam satisfatoriamente as necessidades do "cliente do plano". Ainda hoje o "cliente particular"é o melhor e mais rapidamente atendido. O dinheiro ainda manda. Enfim... Terra de ninguém a que vivemos, mas vivemos.
Filho é para sempre. Mesmo depois de adulto. Ser mãe ou pai é para sempre. Isso é fato real e imutável. Mesmo quem não tem filhos é capaz de ter essa consciência, basta refletir (linguagem pedagógica incruada... odeio...) um pouquinho, pois estar hoje em carne e osso nessa terra de ninguém significa ser filho de alguém, significa em parte ter a mínima consciência do que é a pa(ma)ternidade. Independentemente de exercer essa função, faz parte dela.
E num mundo como esse em que nós vivemos? Vale a pena ter filhos? Qual a vantagem ou desvantagem? Por que ter filhos? Ouço discursos dos mais diversos a respeito do assunto. Tem gente que desconsidera totalmente essa possibilidade por considerar loucura colocar no mundo crianças inocentes numa terra tão injusta, violenta e de difícil sobrevivência. Outros "não querem morrer sem perpetuar no nome", ou ainda só consideram a felicidade completa de uma relação a dois com a vinda de um filho. Há também os que tem penca de filhos porque adoram trepar e na hora do tesão esquecem-se totalmente que daquela foda gostosa pode vir uma vida... Para a vida toda... 
Devido a diversidade de opiniões temos e vemos hoje uma grande variedade de perfil nas nossas crianças. Mimadas, abandonadas, cheirosas, fedidas, trancadas a sete chaves eu seus apartamentos ou largadas a própria sorte nas ruas da cidade e inconscientemente prevemos o futuro de cada uma delas (e não venha me dizer que você nunca se pegou fazendo papel de vidente...). Fotografamos na mente a imagem dessas crianças e imediatamente traçamos um destino para cada uma delas: "essa tem um futuro brilhante! Nossa... coitada, essa com certeza vai virar marginal e parar na FEBEM". Rótulos. Grande paranormais ou videntes que somos. Grande bosta que somos, grande mundo de bosta em que vivemos.
Eu sou filha e sou mãe. Vivencio os dois lados da pa(ma)ternidade (fui e sou até hoje pai e mãe). Para mim  (e isso é muito pessoal) ser filha e ser mãe além de ser uma experiência única (frase típica, mas insubstituível) é construir e preservar histórias. Eu faço parte da história de vida dos meus pais assim como da história de vida da minha filha. Nós construímos isso. (do caralho!). Carrego na memória histórias da minha meninice e da meninice da minha filha, assim como meus pais também carregam, assim como minha filha está construindo as suas e participando da minha. Ouço as histórias da meninice de meu pai. Ouvia também as da minha mãe (ela morreu nova). A gente se descobre a todo momento e nossas histórias se fundem cada vez mais com o passar dos anos. Se transforma em uma única e grande história.

Este final de semana eu descobri como meu avô Eishim que eu não conheci morreu. Ele suicidou-se. Ingeriu veneno. Meu pai me contou, eu não sabia. Meu pai disse que ele tinha muito ciúme da minha avó Kana e em uma dessas crises de ciúme resolveu se matar. Meu pai tinha na época dezoito anos. Disse ele, apesar do raciocínio já bem prejudicado pela idade e por problemas de saúde que foi ele quem fez a barba do seu pai morto para enterrá-lo. Foi mais uma história triste que ele me contou, dentre tantas outras que quando mais moço mas já pai de família ele contava. Infelizmente ele tem mais histórias tristes do que alegres para contar. Meu pai passou fome, eu não.Temos histórias diferentes. Meu pai não chorava, agora ele chora. Mesmo assim continuamos a construir a nossa história agora junto as da minha filha. Histórias ainda de menina as dela. Um dia ela vai ser mulher... Pensando bem ela já é uma mulher. O tempo passa muito rápido e nós envelhecemos. É como jogar areia dentro de uma garrafa, quando chega próximo ao gargalo ela enche rapidinho e quando nos damos conta, se completa e transborda. Aí é a hora de botar a rolha. Um dia meu pai vai morrer, assim como morreu meu avô Eishim, assim como morreu minha mãe, assim como um dia eu também vou morrer.
Construir histórias não tem preço. Eu gosto de ser filha, gosto de ser mãe. É algo impagável.
Há quem não pense assim. Tudo bem, mas quem um dia irá contar o que ela um dia pensou da vida?

Caminante, son tus huellas
el camino, y nada más;
caminante, no hay camino,
se hace camino al andar.
Al andar se hace camino,
y al volver la vista atrás
se ve la senda que nunca
se ha de volver a pisar.
Caminante, no hay camino,
sino estelas en la mar. 



(António Machado)
Paula Miasato





Um comentário:

luciane mansano disse...

Ah Paula (chegada) que lindo texto, amei e me identifiquei com ele.
É isso mesmo estamos fazendo HISTÓRIA e também revivendo histórias do passado.
Assim é a vida!!

Beijos e câmbio!!!

Lu Mansano