quarta-feira, 18 de maio de 2011

DE OLHOS FECHADOS

(Klimt)


Ao fechar os olhos posso perfeitamente rever a cena. Ela com o vestido velho e desbotado pelos anos de uso, semi curto, mais curto ainda agora por causa da barriga redonda e pontuda que carregava e acolhia parte de mim, deixado lá no ato do amor.
Engraçado como a gravidez ilumina uma mulher. Ela lá, o mesmo vestido de solteira agora sem cor envolvia e delineava quem estava por vir. Encostava a barriga no beiral da pia enquanto picava a cebola do feijão. Nos pés, pantufas cor de rosa, em uma das mãos a cebola, na outra a faca. Os olhos piscavam e lacrimejavam freneticamente com o tempero.
Eu sentado em uma das cadeiras disfarçava em frente ao note que lia os e-mails enquanto aguardava o jantar, mas olhava mesmo era para ela, linda, cada vez mais linda, cada vez mais minha, me carregando dentro de si.
Hora e meia ela voltava o olhar para mim e sorria com os olhos chorosos de cebola, as mãos empanadas com seus pedacinhos. Achava aquilo lindo.
Sempre que pegava a colher de pau para refogar a cebola chegava em mim, aproximava o rosto do meu dependurando a barriga e empinando o bumbum, olhava a tela do note e dizia com voz dengosa: Já está terminando? Queria que lavasse o alface para mim, não gosto daquelas larvinhas que as vezes vem no pé... Lava? Fazia isso premeditadamente porque sabia que eu adorava ve-la com a colher de pau na mão esfregando " despropositalmente" a barriga no meu braço e arremessando o bumbum para trás. Isso me deixava encantado e ao mesmo tempo tarado. A danada sabia disso, era ligeira, me conhecia melhor que a si mesma. Sabia exatamente qual seria a minha reação.
Fechava o note, beijava a sua barriga de olhos serrados, voltava o olhar para ela, inevitavelmente sorria enquanto afundava a mão por entre suas coxas até apertar uma das nádegas como as velhas fazem em feiras livres com as frutas, para ver se estão boas para consumo. O cheiro da cebola fritando sozinha na panela e ela de olhos fechados sorrindo, mostrava por entre a boca semi aberta a língua rosa. O punho amolecia e os dedos flácidos deixavam a colher de pau cair no chão e eu a possuía com tesão amor e pantufas. Nunca usava calcinha, era tão bom... aquela vagina arejada e úmida a minha espera nunca dizia não.
O bebe nasceu, mas levou a cebola, a colher de pau e o vestido velho desbotado.
Toda vez que olho para a pia e a vejo sem tempero, fecho os olhos e posso rever a cena.
Até sinto o cheiro da cebola queimando. É um silencio aromático, nostálgico.
Sempre sorrio de olhos fechados.


Pam Orbacam.


2 comentários:

Augusto disse...

Texto lindão...gostei do clima...e adoro cheiro de cebola no fogo...
bj

Paula Miasato disse...

Cheiro, cheiro, cheiro... Entra pelo nariz e gruda nas paredes da alma. Fica que nunca vai embora.